quinta-feira, 12 de janeiro de 2006

AS “LINHAS DE TORRES” EM BTT I - De Alverca a Montachique (2.ª linha, 1.º troço)

Em Santa Eulália restabelecendo as energias...


AS “LINHAS DE TORRES” EM BTT

I - De Alverca a Montachique (2.ª linha, 1.º troço)


TEXTO PUBLICADO NA REVISTA ONBIKE DE JANEIRO / FEVEREIRO 2006

Esta é, provavelmente, a mais extenuante das cinco todas as incursões das “Linhas”. São 70 kms. e um acumulado ascendente de 2,4 kms. a exigirem uma forma física e mental a toda a prova.

O início dá-se num local simbólico: o Forte da Casa, junto a Alverca. O nome da terra tem origem num dos primeiros redutos da 2.ª linha junto ao Tejo.

A nossa sugestão é que a viatura seja estacionada no miolo da povoação junto a uma ruína bem conservada. Trata-se da “Obra n.º 38” [1], que dá o nome à terra. É um bom começo já que, com a sua muralha em cantaria, este é um dos redutos mais vistosos desta primeira incursão.

Esta área está pejada de redutos o que não é de admirar já que é a zona natural de passagem de N. para S. em direcção a Lisboa, encaixada entre o Tejo e a montanha, como o provam a circunstância de, actualmente, ali passarem três vias de penetração: a EN10, a A1 e a ferrovia. Era pois estratégica a defesa desta passagem.

As primeiras pedaladas são assim para visitar os redutos da zona:

  • a obra 34, junto à EN10;
  • a obra 35, recentemente vedada para protecção;
  • a obra 36 visível ao longe mas inacessível, nos terrenos da Central de Cervejas;
  • a obra 126, ou “Forte da Rua Nova” também recém vedada, já a caminho de poente;
  • e a obra 39, ou “Forte da Arroteia”, com uma magnífica vista sobre o vale de Alfarrobeira e a A1.

A descida até ao vale faz-se por um vertiginoso single-track onde é de toda a conveniência que a nossa atenção não se disperse com a paisagem.

A partir daqui e, não existindo alternativa todo o terreno, pedalamos por estrada para NE para ultrapassarmos a zona dos nós rodoviários. Alcançamos então o primeiro grande desafio: a incrível subida da ribeira de A-dos-Potes pelo caminho paralelo à CREL. A inclinação das sucessivas rampas é incrível a exigir empenhamento total e com o recurso à cremalheira de 22 dentes a tornar-se inevitável, pese embora o piso estar pavimentado.

Cem metros em altitude são vencidos em cerca de 1 km. à custa da capacidade de sofrimento. Chegamos à zona do entroncamento com a A10. Transposta a mesma, entramos em zona plana até ao “Forte da Vinha” (obra 125). Este vestígio está muito maltratado e, à semelhança de muitos outros, coberto de vegetação. Descemos então para o vale, já em terra batida, pelo meio de uma vinha. Tempo de subir de novo para atravessarmos uma zona rural de grande beleza, primeiro para N. e depois para poente.

A próxima dificuldade é a travessia do vale da Ribeira do Boição com uma curta mas penosa subida até ao “Monte do Forte” (mais um nome sugestivo) na Serra de Alrota. Num pequeno planalto, na cota dos 311 m., encontramos um par de redutos (obras 18 e 19) dominando, com uma vista incrível, todo o vale.


Agora é descer rapidamente para o vale do Rio Pequeno onde seguimos por um asfalto praticamente deserto, cruzamos o rio, subimos e saímos da estrada para um caminho rural. De novo passamos por uma zona muito interessante pelo meio de quintas, culturas e pequenos bosques, sempre para poente. Apesar de não existirem dificuldades de maior há que vencer uma subida violenta com 200 metros logo após a Ribeira da Tesoureira.

Descemos para Sobreira, subimos, viramos para sul e começamos a aproximarmo-nos da zona de São Gião e de um conjunto significativo de redutos. Os primeiros são os Fortes da Azinheira e Capitão (obras 53 e 52) que ficam no topo de uma urbanização de moradias. Não estão em grande estado: a vegetação impera e um deles tem implantada uma estação celular.

É tempo de descer até à EN374, que é percorrida durante uma centena de metros para N., viramos à esquerda, e por uma rampa brutal, subimos até ao Forte dos Outeirinhos (obra 58). Por um caminho rural chegamos à Charneca, junto à A8, o ponto mais a poente desta nossa incursão.


Aí chegados rumamos agora para S. para ascendermos, continuamente, até ao Outeiro do Além e ao seu Forte (obra 59). Descemos e começamos, de novo, a subir fortemente (de tal modo que se torna impossível seguir montado) até aos dois fortes da Achada (obras 60 e 61) esta última, apesar de ser em terra, mantém o seu fosso intacto dando-nos uma ideia aproximada de como era constituído um reduto típico das Linhas de Torres.

Tempo de descer até Montachique passando ao largo da obra 54 (inacessível em propriedade privada) e daí até ao Vale de São Gião onde subimos pela estrada pelo lado nascente do Parque de Montachique, descartando de novo um reduto (obra 56) [2], saindo por um caminho florestal até ao Forte do Permouro (obra 55) e descendo, depois por meio de um single-track, de novo até à estrada.

Tempo de abordarmos aquele que é, literalmente, o ponto alto da incursão: o topo de Montachique aos 409 metros. Não se trata de nenhum reduto mas antes de um dos míticos postos de sinais. A ascensão é muito complexa por uma rampa íngreme de asfalto e onde o empenhamento terá de ser forte sob pena de sermos vencidos pelo desnível. No entanto a vista do alto é magnífica e justifica o esforço.

Sem muito tempo para contemplações descemos e seguimos, agora, para nascente chegando ao reduto correspondente à obra 57, onde se pode avistar o seu fosso e as paredes em terra batida. Continuamos então sempre pelo topo das Ribas com o vale lá bem em baixo e pela também sugestiva “Estrada do Forte” que é a calçada militar construída na época.

Esta é uma zona de topo exposta aos elementos numa paisagem despojada de arvores, onde o vento predomina. Chegamos assim ao Forte das Ribas (obra 51) em cantaria, em bom estado e onde se sente a História. O mesmo é válido para o Forte do Picoto (obra 50) ali perto após se transpor a zona da Ribeira do Cocho, junto a Fanhões. Esta zona é estupenda com o seu parque eólico e porque, após se subir até à Estação Eléctrica do Mosqueiro, a descida até à CREL é estonteante com a sua parte final ao bom estilo “estômago no selim” actuando como um teste à têmpera de travões e nervos.

Tomamos a EN115 para sul, cruzamos o Trancão e seguimos a estrada que sobe para o Zambujal, transpomo-lo e continuamos a subir rolando a meia encosta por cima do MARL até Santa Eulália. A partir daí, sobe-se sempre até ao Alto de Serves (outro posto de sinais a 351 metros), já com muitos kms. e muita ascensão nas pernas. Continuamos, pelo topo, até ao Alto da Aguieira onde se situam os três redutos mais interessantes desta incursão (obras 40, 41 e 42) dominando, altaneiros e em cantaria, a zona de Alverca. O alívio aqui apodera-se de nós: já está à vista o final!

Agora é sempre a descer não sem antes visitarmos o Forte da Boca da Lapa (obra 127) que fica sobre Vialonga num moinho adaptado. Alcançada a Ribeira de Alfarrobeira subimos até ao Forte da Casa e ao final desta nossa incursão.


[1] O modo mais correcto de enunciar os diferentes redutos independentemente do seu nome, que é subjectivo é, precisamente, pelo seu número de obra. Iremos manter esse critério.

[2] Este reduto encontra-se dentro do Parque Municipal de Montachique onde está impedida a circulação de velocípedes, mais uma pérola administrativa autárquica.

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