quarta-feira, 16 de maio de 2007

RELATO II RAIDE BTT SETÚBAL - ALGARVE - parte I - texto: Rui Sousa, fotos: Ricardo


Já com algum atraso (o empeno foi grande), aqui fica o relato do II Raide
BTT Setúbal - Odemira - Algarve da FPCUB, vista de fora (como organizador) e
de dentro (como participante).

Dia 0:
Foi o dia mais difícil dos 3. Felizmente tirei a tarde de férias e mal sai
do trabalho começou a correria. Um almoço rápido e 1ª paragem na Ciclonatur,
para ir buscar o material suplente de apoio ao Raide. A 2ª paragem no Aki
para comprar zip-ties, a 3ª paragem em Benfica, na Pastelaria Nilo (onde
trabalha o meu pai) para ir buscar caixas de cartão para proteger as bikes
no regresso. Por fim, ir à FPCUB imprimir e plastificar os dorsais e as
etiquetas da bagagem, além de combinar os últimos detalhes. Ufa!

Ainda faltava arrumar tudo dentro do carro. O que vale é que a mala parece
que estica e lá coube a tralha toda! Com tudo isto só me deitei depois da
meia-noite, para acordar às 5:30. Vida dura esta :).


Dia 1:

O nervoso da partida.
Tínhamos encontro marcado em Setúbal às 7:00, metemos o material todo na
pick-up e fomos apanhar o ferrie das 7:15. No ferrie havia 2 tipos de fauna
bem distintos: os trabalhadores da construção civil dos empreendimentos de
Tróia e uns tipos com ar estranho, todos vestidos com uns calções de licra
pretos e uma camisolas coloridas. Mas não estamos em Dezembro nem têm pneus
finos, não deve ser o Tróia-Sagres versão primaveril!

Felizmente os nossos contactos com o São Pedro funcionaram bem e a chuva
prometida estava longe do horizonte. O ambiente era de festa e ansiedade.
Aproveitamos o tempo da viagem para ir conhecendo os participantes (se bem
que grande parte eram velhos amigos destas andanças) e distribuir os
dorsais.

À saída do ferrie instalamos a confusão! Bicicletas por todo o lado, o
camião a receber a bagagem, toda a gente a acabar de preparar-se para a
grande aventura. Havia problemas de ultima hora com o GPS, pois trabalhar
com a caixinha ainda era novidade para alguns dos participantes. Eu apanhei
um grande susto, pois perdi o meu saco de bagagem. Felizmente alguém já o
tinha atirado para dentro do camião, e lá apareceu no fundo atrás de todos
os outros.

Faltava ainda uma equipa. Costuma-se dizer que quem está mais perto é o
ultimo a chegar, e a regra confirmou-se. Faltavam os OTT 4, que ficaram a
dormir em Tróia. Mas estavam perdoados, tinham vindo do norte no dia
anterior! Lá apareceram, foi feito um pequeno briefing e rumámos a Sul!


Aquecimento à la Tróia-Sagres
Como tínhamos 6 guias, ficamos divididos em 3 grupos. À frente, por serem os
mais rápidos, os Super-Travesseiros (para quem não sabe o que isto quer
dizer, vão participar no TransPortugal organizado pela Ciclonatur –
www.supertravessia.com) Jorge Manso e Cláudio Nogueira. Numa posição
intermédia, o Pedro Roque e eu. Atrás, a fechar a caravana, a Marta Vieira e
o Luís Triguinho, que esteve no estaleiro e queixava-se que estava a andar
pouco e gordo. Pois, pois…

Deixamos partir o pelotão e seguimos. Apesar do alcatrão, é uma zona bonita,
ali entalada entre o rio à esquerda e o mar à direita. Pena não haver um
trilho com o piso duro, pois com 140 km pela frente não se pode desperdiçar
energias a patinar na areia. Mas é uma forma de relembrar os já muitos
Tróia-Sagres em que participei e constatar a diferença que fazem os pneus
finos naquele piso.


No mundo do arroz
Rapidamente se chega à Comparta, onde íamos aproveitar o troço da Vala Real
para sair um pouco do asfalto e pedalar pelos famosos arrozais. Aproveitei
para parar e besuntar-me com o protector solar, porque o Sol já queimava.

A pequena paragem foi suficiente para que quem vinha atrás nos apanhasse.
Passaram os OTT4, os Alfa e os Averisbike. Os Averisbike tiveram um problema
com o GPS e vinham à boleia dos Alfa, disseram que iam continuar com eles.
Tivemos que os avisar para não o fazer, pois os Alfa poderiam também
chamar-se TGV, pois também estavam a treinar para a TransPortugal, ainda
vinham a aquecer!!

Como o Triguinho afinal se andava a queixar de excesso de peso sem razão,
trocamos de equipa, indo ele com o Pedro Roque e ficando eu atrás com a
Marta. Um pouco mais à frente estavam os Raposa do Mato parados com um furo,
pronuncio do que se iria passar no dia a seguir.

Este pequeno troço entre a Comporta e o Carvalhal não tem dificuldades de
maior (é um estradão completamente plano), mas ainda bem que é assim, para
se poder apreciar a paisagem. Pedala-se entre um canal de água e os campos
de arroz, que vão mudando de aspecto conforme a época do ano. À direita
temos uma duna com pinheiros e outras árvores de grande porte, que protege
esta estreita faixa de terreno da força do mar. Olhando para cima, temos o
céu repleto de pássaros de todos os tamanhos, que aproveitam os arrozais
para se alimentar, numa feliz comunhão homem-fauna.


Mais um pouco de asfalto…antes da planície enrugada.
Ao chegar ao Carvalhal, retoma-se o asfalto até Melides, pois a areia nos
trilhos tornam a progressão da bicicleta quase impossível. É uma estrada que
é sombreada por pinhais e também plana, pelo que se chega depressa a
Melides, onde verdadeiramente vão começar as dificuldades.

Ao passar pelo Carvalhal vi os Averisbike parados na Junta de Freguesia.
Tentavam carregar o track no GPS, mas infelizmente não é assim tão simples,
pois é necessário instalar software no PC. Tiveram então que seguir
connosco.



Alentejo plano…onde???
Os Averisbike foram um pouco à nossa frente, mas quando chegamos a Melides
eles ainda estavam lá, pois muitas equipas pararam no café para repor as
energias. Já tínhamos percorrido 45 km! A Marta estava a ter algumas
dificuldades em ganhar ritmo, pois dormir pouco para ela é demolidor. Ainda
por cima estávamos a entrar na parte mais difícil do percurso.

É uma zona de serra, onde se passam barrancos atrás de barrancos. A Marta
vinha cansada, fazia as subidas devagar mas o pior mesmo eram as descidas,
onde era preciso força para segurar a bicicleta e reflexos rápidos para
fugir das pedras. Chegou a considerar ir para o jipe dormir um bocado e
continuar mais à frente, mas como vinham 2 pessoas na viatura, tinha que ir
encaixada no lugar do meio, achou que não ia conseguir descansar!

Mas devagarinho lá foi passando barranco atrás de barranco. Parámos um pouco
e comeu uma barra de doce e uma banana, que um pouco mais à frente começaram
a fazer efeito. Os barrancos também foram ficando mais suaves pelo que o
pior já tinha passado, começamos a pedalar a bom ritmo.

Já a chegar a Santiago do Cacém a fome também começou a apertar comigo.
Comecei a dizer que ia parar para comer todas as porcarias a que tinha
direito, uma bifana cheia de mostarda, uma coca-cola e batatas fritas. Aí a
Marta meteu o turbo e começou a pedalar ainda mais rápido, estava a ver que
era eu que ficava para trás! A fome faz milagres!


Restaurante Carapinha, as melhores bifanas de Santiago do Cacém
Quando chegamos a Santiago do Cacém parámos no Restaurante Carapinha, o
primeiro tasco que aparece no caminho! Afinal não estávamos assim tão
atrasados, ainda lá estavam a acabar de comer umas bifanas em pão alentejano
com aspecto delicioso os KedasBike e os Raposas do Mato.

Comemos todas as porcarias a que tínhamos direito e ainda comprei um
chocolate que se revelou muito útil mais lá para o fim do dia. Sobe também
no final do dia que a bifana vinha em pão alentejano porque as carcaças
tinham acabado. Devia ser considerado crime desperdiçar uma bifana daquelas
com uma carcaça, havendo um pão alentejano tão bom!


A caminho do Paiol, às curvinhas pela serra
Mal saímos das bifanas encontramos os Raposas do Mato a encher os pneus numa
bomba de gasolina, pelo que fomos juntos com eles até à Soneca. Descobrimos
que o irmão gémeo de uma das raposas é colega de faculdade da Marta. Como o
mundo é pequeno!

O percurso até à Soneca não tem dificuldades de maior, mas vai moendo aos
poucos. É um percurso muito belo, no meio dos sobreiros e das azinheiras,
ora sobe, ora desce, ora sobe mais um pouco. Um pouco antes de se chegar à
Sonega passa-se a barragem de Morgavel pelo paredão, uma bela albufeira onde
sopra sempre algum vento. Depois até à Sonega sobe-se mais um pouco, pelo
que a chegada à aldeia é sempre um bom pretexto para comer alguma coisa e
repor energias.


A serra vista da planície
A Sonega marca uma transição na paisagem, pois a partir de agora passa-se a
circular entre campos agrícolas completamente floridos nesta época do ano. É
um tapete colorido que ondula ao sabor do vento, como se estivesse vivo!

A bifana continuava a fornecer energia, a Marta pedalava a bom ritmo apesar
dos já muitos quilómetros efectuados. No entanto com a paragem na Sonega
deixamos de ver os Raposas do Mato e os KedasBike.

Ao chegarmos mais perto da Serra do Cercal apanhamos um estradão que é uma
autêntica AE, óptima para ganhar velocidade e avançar uns bons quilómetros
sem grande esforço.

Após passarmos a estrada N390 acabam as facilidades, fazemos uma descida
cheia de pedra até passarmos a ribeira do Corgo. Como quem desce, sobe, do
outro lado temos de trepar também no meio da pedra, num local onde só os
mais fortes não desmontam.

Rapidamente se chega à estrada N532, que se atravessa para entrar num
estradão no meio dos restos de um eucaliptal cortado este ano. Já começa a
cheirar a Odemira!


Odemira a aproximar-se e as forças a esgotarem-se
Após o estradão no meio do ex-eucaliptal chega-se a Troviscais e a partir
daí o percurso é quase todo em alcatrão. E que bem que sabe o alcatrão
depois de tantos quilómetros, quando já só se pensa em chegar e tomar um
belo banho! Mas as dificuldades não se afastaram, pois a falsa planície
alentejana faz mossa e qualquer pequena subida já parece uma montanha de 1º
categoria.

Fui numa dessas “montanhas” que encontramos os KedasBike, a depenar uma
nespereira! Quando parei ouvi o dono da nespereira a gritar de casa: “Já
chega! Já chega!” A fome é negra!

Chegamos à estrada principal para Odemira, a N120. Estava prometida uma
valente descida até à ribeira do Torgal, mas a gravidade deve ter tido algum
problema e afinal só apareciam subidas, a parte a descer deixou muito a
desejar…

Depois de passar a ribeira já faltava pouco. A Marta já tinha gasto as
reservas todas, vinha em serviços mínimos. Eu tentava incentiva-la, mas não
tive grande sucesso. Já não fizemos um pequeno desvio por terra do lado
direito (será que alguém fez?) e chegamos ao pavilhão por volta das 20:00,
140 km depois.

Que grande jornada de BTT. E amanhã há mais!

Em breve o relato do 2º dia.
Rui Sousa

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