sábado, 12 de dezembro de 2009

THE WOLFRAMIC PATHS



8 de Dezembro de 2009
66 kms.
2700 m. altitude acumulada positiva
Concelhos de São Pedro do Sul e Arouca

Texto e Fotos: APRO


Despite the distance being relatively short (66 kms.) the average was incredibly low (below 10 kms.) due to the intense uphills and countless miles traveled sometimes on foot, pushing and carrying  the bike, an effort proved to be of extreme harshness which contributed to the hardness of this ride.


Após esta inesquecível incursão a solo irei, tal como na maternal instrução, escrever repetidas vezes a seguinte frase: “caminhos pedonais nem sempre são cicláveis!”. Convenhamos que uma coisa é percorrermos os ditos com umas botas de trekking, outra, diferente, é transportar 10 kgs. de alumínio colina acima.

De facto o track que elaborei (a partir de uma compilação de outros) para percorrer partes das serras de São Macário, Arada e Freita, partindo e chegando nas termas de São Pedro do Sul onde estive a banhos explorando um fim de semana prolongado, conjugou a intensa beleza natural das serras, com alguns trilhos impossíveis de serem percorridos em cima do magro selim de uma bicicleta ainda que, pasme-se, estejam referenciados em tracks anteriores com a indicação BTT.

Apesar da distância ser relativamente reduzida (66 kms.) a média foi incrivelmente baixa (abaixo dos 10 kms.) em virtude das intensas subidas e de inúmeros quilómetros terem sido percorridos a pé, ora empurrando a bicicleta, ora carregando a dita num esforço que, a espaços, se revelou de enorme dureza e que contribuiu para a média muito baixa verificada.



A tarefa nunca ficou facilitada, excepto no final em que se baixou de cota fortemente. Estas são terras de montanha como poucas em Portugal. De facto, desde o início, junto ao balneário D. Afonso Henriques, nas termas, que se começou a subir intensamente até à zona de Carvalhais e daí até ao entroncamento onde se deriva para São Macário (nascente) e a Fraguinha (poente). Comecei a uma altitude inferior aos 150 metros e só parei nos quase 1000 metros de altitude e isto numa distância de 15 kms. o que dá bem a ideia do grau de dificuldade. Ainda assim, o tempo colaborou. Após a tempestade da ante-véspera o dia estava relativamente ameno, embora nublado.

Valeu o facto, abonatório, da subida ter sido feita em asfalto que, na sua parte final, serpenteava o relevo pela Arada acima até ao entroncamento. Aqui derivei para nascente, em direcção ao Alto de São Macário mas, antes de o atingir, abandonei o asfalto descendo vigorosamente em direcção à lendária aldeia de Drave,




A partir do momento em que comecei a descer para Drave acabaram-se as facilidades (leia-se, o piso ciclável). De facto, daqui até Côvelo de Paivó, inevitavelmente, a maior parte do traçado teve de ser efectuado a pé. Descem-se as primeiras centenas de metros até se ficar com a aldeia à vista lá bem no fundo do vale. A dada altura acaba-se o estradão e começa um caminho de cabras igualmente descendente que, apenas a espaços, se deixa ciclar. A princípio resolvi testar a minha técnica naquele lajeado de xisto já que, o facto de ser descendente, me pareceu que facilitava a transposição. Todavia, rapidamente o bom senso prevaleceu – o facto de ali estar sozinho, num ermo serrano, levou a que optasse por acompanhar a bicicleta a caminhar. Sejamos razoáveis – qualquer acidente naquele local poderia ter consequências imprevisíveis – ninguém sabia que eu por ali andava. De resto a diferença de velocidade entre pedalar ou caminhar era muito pequena e sobrava tempo para fotografar abundantemente.

Drave é mesmo um local lendário. Inóspito e acolhedor a um tempo embora deserto e local de romagem dos aventureiros amantes da natureza e de recolhimento espiritual em virtude do seu extremo isolamento. O único acesso é pelo caminho de cabras que calcorreia, descendo, mais de um quilómetro impossível de percorrer por meios mecânicos. Nestas circunstâncias é fácil de entender que se tenha desertificado integralmente da presença humana ainda que, seja habitado de verão por escuteiros e crentes em busca da espiritualidade que um local daqueles confere. É um sítio diferente de tudo o que vimos anteriormente. Água por todo o lado escorrendo fortemente das linhas que drenam as enormes montanhas e que engrossam a ribeira que irá aumentar o Paivó e que, de enxurradas múltiplas conferirá a fama das límpidas águas bravas do Paiva próprias para a canoagem e o jangadismo.




Naturalmente Drave é um daqueles locais impossíveis de descrever seja por imagens seja, muito menos, por prosa mas, ainda assim, num punhado de palavras permitam-me a ousadia de ensaiar: xisto omnipresente, cascatas e água cristalina, a eira, uma ermida de um branco imaculado, um cruzeiro marcando o terreno, meia dúzia de casebres alcantilados, duas pontes unindo as margens das ribeiras e um silêncio sepulcral. Um local mágico, portanto.

O problema agora colocava-se na saída. É que o caminho de cabras continuava contornando a meia-encosta e acompanhando, a cota superior, a ribeira alimentada continuamente por escorrências várias das dobras montanhosas por onde caminhávamos já que, apenas a espaços, se conseguia pedalar. O track conferia, de resto, com o traçado da Pequena Rota (PR14 “Aldeia Mágica”) como testemunhavam os tracejados vermelho e amarelo demonstrando que aquele era um trilho de caminheiros mas inadequados para ciclistas.




Contornada a montanha avisto, no fundo do vale a aldeia de Regoufe, a ribeira do mesmo nome e o couto mineiro abandonado, explorado pelos britânicos, a cota superior à aldeia. A princípio o trilho descendente deixa-se pedalar sem dificuldade mas, a dado passo, o xisto solta-se e a opção é caminhar até porque a pendente é forte. A entrada na aldeia faz-se em grande estilo cruzando a ribeira por uma ponte e entrando nas suas ruas típicas. Ao contrário de Drave esta é uma terra viva. Pergunto aos locais se o caminho que segue para poente liga a Côvelo de Paivó, o que confirmam tendo, no entanto, acrescentado que se tratava de um antigo traçado para os carros de bois. Tive de optar entre por aí seguir, acompanhando, de novo uma rota pedestre (a PR 13 “Na Senda do Paivó) ou ir por um asfalto ascendente que triplicava a distância. Optei pela distância mais curta e mais bonita acompanhando o esforço do Paivó para jusante.

Ao xisto, passada a ribeira de Regoufe, sucedeu o granito em todo o seu esplendor e o lajeado era agora nesta pedra com igual dificuldade em se deixar pedalar. A natureza é que continuava a oferecer panorâmicas impressionantes, desta vez para o lado da Serra da Freita que se preparava para receber a nossa passagem ainda que tal apenas sucedesse à custa de enorme esforço empurrando a bicicleta pelo lajeado de granito observando, a espaços, as incontáveis marcas das passagens dos carros de bois. Foram cerca de 4 quilómetros duros mas com uma descida de antologia até à aldeia de Côvelo onde a cota baixou aos 200 metros como que a demonstrar que haveria que penar muito para regressar, de novo, à cota dos 100 metros e à descida final até às termas.
Fiquei um pouco a contemplar as águas bravas do Paivó em Côvelo. Há um poder de sedução naquela torrente fria que rasga velozmente o vale para jusante. Este é um local quase imaculado e onde a artificialização custa em chegar. A pausa serviu também para reganhar forças para o que se seguiria: nada mais do que a ascensão da encosta nascente da Freita. Mesmo por asfalto a pendente era muito forte e o empenho teve de ser correspondente. O relevo também era ingrato e, longe de uma subida contínua, a dado momento recomeça a descida e a baixa de cota para a transposição de nova ribeira.

Nada mais me restou senão, após esta nova travessia, renovar o empenhamento e vencer penosamente a subida embora ela fosse, agora, relativamente suave até Rio de Frades onde parei de novo. Esta aldeia era o centro de um importante couto mineiro de volfrâmio, explorado pelos alemães e que fizeram a fortuna de alguns e a desgraça de muitos em plena segunda guerra mundial. É actualmente ponto de partida e chegada de caminhos pedestres vários explorando o filão da memória da lendária saga do volfrâmio.

Em conversa com uma idosa, proprietária da singela cafetaria da aldeia fiquei a saber que a estrada acabava ali a pouco mais de uma centena de metros. Quando soube que iria para Cabreiros disse que tal era impossível e que só existia um caminho de cabras, monte acima, com cerca de 3 quilómetros. A alternativa, pura e simplesmente, não existia. Restava seguir mesmo por aquele caminho, colina acima, pelo meio de uma mina de volfrâmio abandonada, com o Rio a correr lá bem em baixo num cenário magnífico daqueles que pensávamos não existirem em Portugal.

Já alguém lhe terá chamado de “caminho dos Incas”. Nós que, muito embora, nunca tenhamos visitado o Peru, temos do mesmo uma ideia semelhante: acidentes geológicos e de relevo imensos e isolamento extremo. O nome oficial é o “Caminho do Carteiro” (PR 6) e problema mesmo foi fazer aqueles mais de 3 kms. que distavam entre Rio de Frades e Cabreiros carregando a bicicleta em peso já que empurrá-la era impossível. Em termos de cota a contagem também foi impressionante e correspondeu a um desnível médio de 10% que me levou dos 400 aos 700 m.




Finalmente cheguei a Cabreiros praticamente no limite das forças pelo que tive de parar um pouco em plena aldeia para recuperar enquanto assistia à chegada dos imensos bois arouquenses das lides do campo. Criaturas impressionantes de vastos cornos a conferirem novo toque de ruralidade à incursão. Mas foi tempo de seguir. Agora a dificuldade consistia em passar dos 700 aos 1000 m. de Coelheira para, finalmente, descer de novo até as termas de São Pedro do Sul.

Se bem que, a partir de Cabreiros, o track apenas se desenrolasse por asfalto, o facto da subida de cota não ser linear, antes implicar algumas descidas rápidas que faziam perder altitude para, de novo se ascender penosamente, fez com que a dureza fosse extrema. Assim passei por Candal e Póvoa das Leiras, de novo em terras concelhias de São Pedro do Sul e na Serra de Arada até que, junto a Coelheira, finalmente o topo da subida, coincidindo com o pôr-do-sol.

Efectuo a última paragem técnica para montar a configuração nocturna: lentes brancas, luzes frontal e traseira e o impermeável “verde radioactivo”, pois a descida afigurava-se rápida e assim foi, em duas fases: a primeira até Santa Cruz da Trapa o que significou descer de perto dos 1000 até aos 350 m. a uma velocidade estonteante aproveitando a réstia de visibilidade. Aí segui pela EN 227 onde, após cerca de 4 kms. viro à direita em direcção às termas e, após uma breve subida aos 400 m. deslizo, aproveitando as curvas e o declive até chegar, finalmente à termas e ao descanso.




Para trás ficaram aqueles que considero como, provavelmente, os mais duros 66 kms. que alguma vez percorri. Se a altimetria é algo violenta (2700 m. positivos) o facto de largos troços terem de ser efectuados a pé complicaram muito a progressão e, sobretudo o troço ascendente entre Rio de Frades e Cabreiros aliou a beleza natural à extrema dificuldade.

A repetir embora, todavia, algumas passagem tenham de ser alteradas em nome da útil ciclabilidade.

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